Administrador Público
Jun 23, 2024 - por Edpo Augusto Ferreira Macedo
Os poderes e deveres do administrador público são elementos cruciais para o funcionamento adequado da Administração Pública. Ao exercer suas funções, o administrador público deve atuar dentro dos limites estabelecidos pela lei, pela moral administrativa e pelo interesse coletivo, garantindo, assim, que suas ações sejam legítimas e justas.

Os poderes do administrador público são conferidos por lei e devem ser utilizados como instrumentos para a consecução do interesse público.
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Poder hierárquico: permite a organização interna da Administração, distribuindo e ordenando as competências de seus órgãos e agentes. Inclui a capacidade de fiscalizar, coordenar, dirigir e aplicar sanções disciplinares.
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Poder disciplinar: autoriza a Administração a apurar infrações e aplicar penalidades aos servidores públicos que desrespeitam normas internas.
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Poder regulamentar: confere ao administrador a competência para editar atos normativos internos que detalhem a aplicação das leis, sem inovar no ordenamento jurídico.
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Poder de polícia: permite a imposição de restrições aos direitos individuais em favor do interesse público, garantindo a ordem pública e a segurança.
Os deveres do administrador público também são rigorosamente determinados pela legislação.
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Dever de legalidade: obriga o administrador a agir estritamente conforme a lei. Nenhum ato administrativo pode ser praticado sem respaldo legal.
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Dever de impessoalidade: determina que as ações do administrador não devem visar a favorecer ou prejudicar pessoas determinadas, mas sim atender ao interesse público de maneira objetiva.
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Dever de moralidade: exige que a atuação do administrador seja ética, honesta e transparente, respeitando os princípios morais que regem a Administração Pública.
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Dever de publicidade: impõe a divulgação dos atos administrativos para garantir a transparência e permitir o controle social sobre a Administração.
O uso do poder administrativo deve ser exercido com responsabilidade, respeitando os limites impostos pela lei. Qualquer desvio de poder ou abuso de autoridade pode acarretar em responsabilidade administrativa, civil e penal para o administrador.
A Lei nº 13.869/2019 , por exemplo, tipifica e pune o abuso de autoridade, assegurando que os administradores que ultrapassam seus poderes sejam devidamente responsabilizados.
A prerrogativa funcional do administrador público é essencialmente uma ferramenta para a promoção do bem comum e a realização dos fins estatais. Uma vez que o administrador deixa o cargo ou a função, ele perde tais prerrogativas, igualando-se aos demais cidadãos. O Estado Democrático de Direito, portanto, não admite privilégios pessoais, mas sim prerrogativas que são funcionais e temporárias.
No Direito Público, diferentemente do Direito Privado, o poder de agir não é uma mera faculdade, mas um dever. O administrador público é obrigado a atuar em prol do interesse público, e sua omissão pode acarretar responsabilidade civil do Estado por danos causados. Esta obrigação de agir em situações que requerem intervenção é um reflexo da função administrativa de proteger e promover os interesses da coletividade.
Poder-dever de agir
O poder-dever de agir da autoridade pública é hoje reconhecido pacificamente pela jurisprudência e pela doutrina. Para o agente público, o poder é, simultaneamente, um dever para com a comunidade e para com os indivíduos, no sentido de quem o detém está sempre na obrigação de exercitá-lo.
Incompatibilidade com a renúncia
Segundo Meirelles, não seria compreensível que uma autoridade pública, como um Governador, por exemplo, abdicasse de seus poderes administrativos, deixando de praticar atos de seu dever funcional. O poder do administrador público, revestido ao mesmo tempo de caráter de dever para a comunidade, é insuscetível de renúncia pelo seu titular. Tal atitude importaria em liberdades com o direito alheio, e o Poder Público não é, nem pode ser, instrumento de cortesias administrativas.
Para o doutrinador, o administrador público possui pouca ou nenhuma liberdade para deixar de praticar atos de sua competência legal. Portanto, a omissão da autoridade ou o silêncio da Administração, quando deveriam agir ou se manifestar, gera responsabilidade para o agente omisso e permite a obtenção do ato omitido por via judicial, especialmente por mandado de segurança, se houver lesão a direito líquido e certo do interessado.
Dever de eficiência
O dever de eficiência foi elevado à categoria de princípio norteador da atividade administrativa pelo art. 37, da Constituição Federal, conforme a Emenda Constitucional 19/1998 .
Referido princípio corresponde ao “dever de boa administração” da doutrina italiana, consagrado pela Reforma Administrativa Federal, segundo o Decreto-Lei nº 200/1967 .
Controle de resultados e sistema de mérito
O dever de eficiência é efetivado através do controle de resultados e sistema de mérito, de acordo com o Decreto-Lei nº 200/1967:
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Controle de resultado na atividade do Executivo (arts. 13 e 25, V);
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Fortalecimento do sistema de mérito (art. 25, VIII);
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Supervisão ministerial da Administração Indireta quanto à eficiência (art. 26, III);
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Recomendações para a demissão ou dispensa de servidores ineficientes ou desidiosos (art. 100).
Quanto à avaliação de desempenho, segundo as alterações no art. 41, da Constituição Federal, dadas pela Emenda Constitucional 19/1998:
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Procedimento de avaliação periódica de desempenho para dispensa de servidor público estável;
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Avaliação especial de desempenho como condição para aquisição da estabilidade.
Eficiência funcional
Considera-se a eficiência funcional, em sentido amplo:
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A produtividade do ocupante do cargo ou função;
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A perfeição do trabalho e sua adequação técnica aos fins visados pela Administração;
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Avaliação dos resultados, confrontação de desempenhos e aperfeiçoamento do pessoal através de seleção e treinamento.
Quanto aos aspectos quantitativos e qualitativos do serviço, considera-se:
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O rendimento efetivo;
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O custo operacional;
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A utilidade real para os administrados e para a Administração, através do desenvolvimento do controle nas dimensões administrativa, econômica e técnica, com:
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Imposição da técnica como fator vinculante em todos os serviços públicos especializados.
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Rejeição de discricionarismos ou opções burocráticas onde segurança, funcionalidade e rendimento dependem de normas e métodos científicos:
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Necessidade de ditames técnicos indispensáveis para decisões administrativas;
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Atos administrativos baseados em relatórios técnicos ou científicos como atos regrados e não discricionários.
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A aplicação do princípio da eficiência se dá em todos os níveis da Administração brasileira, tornando-se incontestável após a Emenda Constitucional 45/2004 (art. 5º, LXXVIII; art. 93, II “c” e “e”; e art. 129, § 4º, da CF).
A Reforma do Judiciário impôs diretamente o dever de eficiência aos órgãos administrativos do Poder Judiciário e do Ministério Público, e impôs indiretamente os mesmos deveres à Administração Pública em geral, prevendo a responsabilização pela ineficiência.
Dever de probidade
O dever de probidade está constitucionalmente integrado na conduta do administrador público como elemento necessário à legitimidade de seus atos.
Este conceito remonta ao antigo direito romano com a distinção entre probus e improbus, refletindo-se na nossa legislação administrativa e na Constituição da República.
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Sanções constitucionais: Conforme o art. 37, § 4º, da Constituição Federal: os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao Erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.
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Regime Jurídico dos Servidores Públicos Civis da União (Lei nº 8.112/1990 ): A RJU, juntamente com outras normas que regulam a conduta dos agentes públicos, contém disposições que coíbem a improbidade no trato dos bens públicos. Estes dispositivos sujeitam os agentes à responsabilização administrativa, civil ou penal, dependendo do caso e da categoria do agente.
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Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/1992 ): A LIA dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de improbidade administrativa, classificando-as em três espécies:
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Enriquecimento ilícito (art. 9º);
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Prejuízo ao erário (art. 10);
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Atentado contra os princípios da Administração Pública (art. 11).
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As sanções estão previstas no artigo 12, e o Judiciário deve aplicá-las considerando a extensão do dano e o proveito patrimonial obtido pelo agente.
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Lei de Ação Popular (Lei nº 4.717/1965 ): Conforme a instituição constitucional (art. 5º, LXXIII), a Lei de Ação Popular especifica os atos passíveis de anulação judicial por serem ilegais e lesivos ao patrimônio público. Isso inclui atos de entidades estatais , autárquicas, fundacionais, paraestatais e até estabelecimentos particulares subvencionados com recursos públicos.
Invalidação de atos administrativos
Os atos administrativos praticados com lesão aos bens e interesses públicos estão sujeitos à invalidação pela própria Administração ou pelo Poder Judiciário, por vício de improbidade, caracterizando uma ilegitimidade que nulifica a conduta do administrador público.
Dever de prestar contas
A prestação de contas é um dever inerente à administração de bens e interesses de terceiros, decorrente da responsabilidade de gestão.
Administrar significa cuidar e conservar bens e interesses que pertencem a outrem, e quem assume essa função deve prestar contas ao titular desses bens.
No contexto da administração pública, a importância da prestação de contas é ainda maior. O administrador público gere bens e interesses da coletividade, assumindo um múnus público.
Assim, a obrigação de prestar contas é inafastável para qualquer administrador público, seja ele um agente político ou um servidor comum.
Abrangência da prestação de contas
A prestação de contas não se limita apenas à gestão financeira ou aos recursos públicos, mas abrange todos os atos de governo e administração.
A Constituição Federal garante o direito à obtenção de certidões das repartições públicas para a defesa de direitos e esclarecimento de situações (art. 5º, XXXIV, “b”) e exige a publicidade dos atos e contratos administrativos. Isso indica que o administrador público deve prestar contas de toda sua atuação aos administrados.
Gestão financeira
A gestão financeira é uma área onde a obrigação de prestar contas é destacada pela Constituição Federal. Os artigos 70 a 75 impõem essa obrigação não apenas aos administradores, mas também a todos os responsáveis por bens e valores públicos.
Essa ênfase demonstra a importância de uma gestão financeira transparente e responsável, garantindo a integridade dos recursos públicos.
Alcance da prestação de contas
A obrigação de prestar contas abrange uma ampla gama de gestores, incluindo administradores de entidades e órgãos públicos, entes paraestatais e até mesmo particulares que recebam subvenções estatais para aplicação determinada (CF, art. 70 e parágrafo único).
A universalidade dessa regra assegura que qualquer gestão de dinheiro público ou administração de bens e interesses da comunidade esteja sujeita a fiscalização e transparência.
Procedimento de prestação de contas
O procedimento para prestação de contas é delineado pelos ditames constitucionais e realizado ao órgão legislativo de cada entidade estatal, com o apoio do Tribunal de Contas competente. Este tribunal desempenha um papel crucial no controle externo da administração financeira, assegurando que a gestão dos recursos públicos seja conduzida com responsabilidade e transparência.
Uso do poder
Nos Estados de Direito, a Administração Pública deve obediência à lei em todas as suas manifestações, incluindo as atividades discricionárias.
O poder administrativo tem limites claros e uma forma legal específica de utilização, não podendo ser usado para arbítrios, violências, perseguições ou favoritismos.
Qualquer ato de autoridade deve estar em conformidade com a lei, a moral da instituição e o interesse público, sob pena de nulidade.
Prerrogativa da autoridade
O uso do poder é uma prerrogativa da autoridade, devendo ser exercido de acordo com as normas legais, a moral da instituição, a finalidade do ato e as exigências do interesse público.
O poder é conferido ao administrador público para ser utilizado em benefício da coletividade, mas dentro dos limites que o bem-estar social exige. O abuso do poder ocorre quando este é empregado fora dos limites legais e sem utilidade pública, como no caso de uso desproporcional da força ou violência contra o administrado.
Abuso do poder
O conceito de abuso do poder no Direito Administrativo brasileiro é crucial para a garantia da legalidade e moralidade na atuação da Administração Pública. Esse instituto pode ser verificado quando a autoridade administrativa, mesmo sendo competente para a prática do ato, excede os limites de suas atribuições ou se desvia das finalidades previstas na norma.
O abuso de poder resulta na invalidade do ato administrativo que o contém.
Teoria do abuso de poder
A teoria do abuso de poder tem raízes na moralidade administrativa e na necessidade de assegurar que os direitos sejam exercidos de maneira legítima e ética.
Doutrinadores como Hauriou e Ripert enfatizam a boa-fé e a moralidade no exercício do poder público.
A jurisprudência brasileira adota a teoria do abuso de poder, combatendo o excesso de poder e o desvio de finalidade com base nos princípios constitucionais da legalidade e moralidade:
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Excesso de poder: Ocorre quando a autoridade ultrapassa os limites de sua competência. Isso pode se dar por atos comissivos, em que a autoridade pratica um ato que não lhe é permitido, ou omissivos, onde a autoridade deixa de praticar um ato ao qual está legalmente obrigada.
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Desvio de finalidade: Caracteriza-se quando a autoridade, embora competente para o ato, pratica-o com finalidade diversa daquela prevista em lei. Esse desvio pode ser difícil de identificar, pois frequentemente se disfarça sob a aparência de legalidade.
Mecanismos de repressão
A doutrina e a jurisprudência têm sistematicamente repudiado esses atos, e o ordenamento jurídico brasileiro dispõe de mecanismos para sua repressão.
Mandado de segurança
Instrumento processual que permite ao cidadão impugnar ato de autoridade que viole direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data. Previsto no artigo 5º, LXIX, da Constituição Federal e regulamentado pela Lei nº 12.016/2009.
Representação por abuso de autoridade
Garantido pelo artigo 5º, XXXIV, “a”, da Constituição Federal, permite a qualquer pessoa representar contra abusos cometidos por autoridades.
Lei de Abuso de Autoridade
Estabelece sanções criminais para os abusos cometidos por autoridades. Vide Lei nº 13.869, de 5 de setembro de 2019 .
Excesso de poder
O conceito de “excesso de poder” está diretamente relacionadoao exercício das faculdades administrativas pela autoridade pública, onde, apesar de ser competente para a prática do ato, ultrapassa os limites permitidos pela lei.
Este fenômeno ocorre quando a autoridade exorbita seu poder, excedendo sua competência legal, o que resulta na nulidade do ato, uma vez que a Administração Pública deve agir estritamente dentro dos limites legais estabelecidos.
São características do excesso de poder:
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Ato arbitrário, ilícito e nulo: Quando a autoridade pública excede seu poder, o ato praticado torna-se arbitrário, ilícito e, consequente, nulo. A legitimidade da conduta administrativa é retirada, colocando o administrador público em situação de ilegalidade.
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Abuso de autoridade: Além de invalidar o ato administrativo, o excesso de poder pode configurar crime de abuso de autoridade, conforme previsto na Lei nº 13.869/2019. Esta lei visa proteger as liberdades individuais garantidas pela Constituição, especialmente no artigo 5º.
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Violações da regra de competência: O excesso de poder pode ocorrer de duas formas principais:
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Descumprimento frontal da lei: A autoridade age claramente além de sua competência, violando diretamente a lei.
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Contorno dissimulado das limitações legais: A autoridade contorna dissimuladamente as limitações impostas pela lei, assumindo poderes que não lhe são legalmente atribuídos.
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A prática de atos com excesso de poder pode ser realizada tanto com culpa quanto com dolo, mas em qualquer hipótese, há violação da regra de competência.
Esta violação é suficiente para invalidar o ato administrativo praticado, reforçando a necessidade de conformidade estrita com as disposições legais por parte dos agentes públicos.
O reconhecimento do excesso de poder é fundamental para assegurar a legalidade dos atos administrativos e a proteção dos direitos individuais contra abusos por parte da Administração Pública. A atuação dos agentes públicos deve sempre observar os limites de sua competência legal, sob pena de invalidação dos atos e eventual responsabilização penal.
Desvio de finalidade
O desvio de finalidade, também conhecido como desvio de poder, ocorre quando a autoridade administrativa, embora atuando dentro dos limites de sua competência, pratica um ato por motivos ou fins diversos daqueles previstos pela lei ou exigidos pelo interesse público.
Segundo Meirelles, esse desvio representa uma violação ideológica ou moral da lei, na medida em que o administrador público busca fins não desejados pelo legislador, ou utiliza motivos ou meios imorais para praticar um ato administrativo aparentemente legal.
São exemplos de desvio de finalidade:
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Desapropriação para fins pessoais: A autoridade pública decreta uma desapropriação alegando utilidade pública, mas na verdade visa satisfazer um interesse pessoal ou favorecer um particular com a subsequente transferência do bem expropriado.
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Permissão sem interesse coletivo: Concede-se uma permissão que não atende ao interesse coletivo.
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Favoritismo em licitações: Classifica-se um concorrente por favoritismo, sem considerar os fins objetivados pela licitação.
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Aquisição inadequada de veículos: Compra-se um tipo de veículo com características incompatíveis com a natureza do serviço a que se destinava.
A Lei nº 4.717/1965, que regulamenta a ação popular, já consigna o desvio de finalidade como vício nulificador do ato administrativo lesivo ao patrimônio público.
Características do ato com desvio de finalidade
O desvio de finalidade é caracterizado quando o agente pratica o ato visando a fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência (art. 2º, “e”, e parágrafo único, “e”). Com essa conceituação legal, o desvio de finalidade entrou definitivamente para o Direito Positivo brasileiro como causa de nulidade dos atos da Administração.
Os atos praticados com desvio de finalidade geralmente são consumados às escondidas ou disfarçados sob uma aparência de legalidade e interesse público.
A identificação do desvio depende de indícios e circunstâncias que revelem a distorção do fim legal, substituído por um fim ilegal ou imoral não desejado pelo legislador. Nesse sentido, o STF já decidiu que “indícios vários e concordantes são prova”.
Prova do desvio de finalidade
A prova do desvio de finalidade pode ser encontrada na documentação do expediente administrativo ou judicial. Também é admitida a prova testemunhal e a prova indiciária, desde que as presunções sejam graves, concordantes e precisas.
Não existem regras gerais sobre quais circunstâncias ou detalhes comprovam o desvio de poder, mas uma das características mais indicativas é a inexatidão ou discordância dos motivos que aparentemente justificam o ato.
Omissão da Administração
A omissão da Administração Pública pode ter efeitos variados sobre a pretensão do administrado, dependendo da disposição normativa específica aplicável ao caso. Em termos gerais, a omissão pode ser interpretada como aprovação ou rejeição do pedido, conforme a previsão legal ou regulamentar.
Determinação legal dos efeitos do silêncio
Quando a norma estabelece que, após determinado prazo, o silêncio administrativo resulta em aprovação ou rejeição do pedido, esse efeito deve ser interpretado de acordo com a determinação legal, independentemente da omissão em si.
Ausência de disposição específica
Na ausência de uma disposição legal específica, os efeitos do silêncio administrativo precisam ser analisados caso a caso.
A Lei nº 9.784/1999, em seus artigos 24 e 49, dispõe sobre prazos para a prática de atos administrativos e para a decisão no processo administrativo. De acordo com esses artigos, os atos devem ser praticados no prazo de cinco dias, salvo motivo de força maior, e a decisão deve ser proferida em até trinta dias após a conclusão da instrução do processo, com possibilidade de prorrogação motivada.
Direito subjetivo do administrado
É importante ressaltar que o administrado não perde seu direito subjetivo enquanto perdurar a omissão da Administração, pois ele tem interesse em conhecer os motivos de uma eventual negativa, especialmente quando se trata de um ato com motivação obrigatória.
Silêncio administrativo
O silêncio administrativo não é considerado um ato administrativo em si, mas uma conduta omissiva que pode ofender direitos individuais ou coletivos, sujeitando-se a correção judicial e reparação de danos.
No Direito Público, o silêncio só tem valor como aceitação ou rejeição do pedido se previsto expressamente por lei. Portanto, enquanto no Direito Privado o silêncio pode ser interpretado como concordância, no Direito Público ele só terá esse efeito se previsto explicitamente pela lei.
A distinção entre ato comissivo e omissivo é relevante para o mandado de segurança, pois, no caso de ato omissivo, o prazo de decadência não se inicia (STF, MS 25.136-1, DJU 6.5.2005).
Quando não há prazo legal, regulamentar ou regimental para a decisão, deve-se aguardar um tempo razoável. Ultrapassado esse tempo, o silêncio administrativo configura abuso de poder, passível de correção judicial.
Direito Administrativo sancionador
O Direito Administrativo sancionador no Brasil é um ramo específico do Direito Administrativo que se dedica à aplicação de sanções em resposta a condutas lesivas ao dever de probidade e contrárias aos princípios da Administração Pública, com destaque para o princípio da moralidade.
Esse conjunto de normas aproxima-se, em muitos aspectos, do Direito Penal, especialmente no que concerne à necessidade de observância dos princípios fundamentais como o da culpabilidade.
Princípio da culpabilidade
No âmbito do Direito Penal, o princípio da culpabilidade estabelece que uma sanção só pode ser imposta quando houver dolo ou culpa na conduta do agente.
Este princípio também é relevante no Direito Administrativo Sancionador, especialmente quando se trata de sanções aplicadas a pessoas físicas, como dirigentes e administradores.
Responsabilidade objetiva e subjetiva
Diferentemente da responsabilidade penal, a responsabilidade administrativa de pessoas jurídicas pode ser objetiva, isto é, independe da comprovação de dolo ou culpa.
No entanto, quando se trata de sanções a indivíduos (agentes públicos ou terceiros), a responsabilidade deve ser analisada sob a ótica da culpabilidade, ou seja, é necessário comprovar a intenção dolosa ou a negligência na conduta.
Improbidade administrativa
As leis que regulam o Direito Administrativo sancionador, como a Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/1992 ), a Lei da Ação Popular (Lei nº 4.717/1965 ) e a Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/2013 ), visam punir condutas que atentem contra a probidade administrativa.
A improbidade administrativa se refere a atos de desonestidade, má-fé ou falta de retidão, e não a meros erros administrativos decorrentes de imprudência, negligência ou imperícia.
Portanto, no contexto das leis mencionadas, as sanções aplicáveis a agentes públicos ou terceiros devem ser baseadas em atos de desonestidade comprovada.
A punição por atos imprudentes, negligentes ou imperitos deve seguir outro regime de sanções administrativas, distinto daquele aplicável aos atos de improbidade.
Lei Anticorrupção
A Lei nº 12.846/2013 , conhecida como Lei Anticorrupção (LAC), introduz importantes mecanismos para a responsabilização objetiva, tanto administrativa quanto civil, das pessoas jurídicas envolvidas na prática de atos ilícitos contra a Administração Pública, nacional ou estrangeira.
A LAC foi criada em consonância com várias convenções internacionais ratificadas pelo Brasil, como a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção , a Convenção Interamericana de Combate à Corrupção e a Convenção da OCDE sobre o Combate à Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionais .
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Aplicação e alcance: A LAC aplica-se às sociedades empresárias, sociedades simples, fundações, associações, entidades ou sociedades estrangeiras que operem no Brasil, sejam estas constituídas de fato ou de direito. Esta lei também se aplica às empresas estatais que exercem atividades econômicas, embora com algumas ressalvas em relação à aplicação das sanções para evitar o comprometimento das atividades públicas.
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Responsabilização objetiva: Um dos principais aspectos da LAC é a responsabilização objetiva das pessoas jurídicas, ou seja, não é necessário provar a culpa ou dolo para que sejam aplicadas as sanções. A simples comprovação da prática do ato ilícito, da lesividade ao patrimônio público ou aos princípios da Administração Pública, e do nexo causal entre a conduta e o resultado é suficiente para a aplicação das sanções previstas.
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Sanções: As sanções administrativas previstas na LAC incluem multas que variam de 0,1% a 20% do faturamento bruto do último exercício anterior à instauração do processo administrativo, excluídos os tributos, e a publicação extraordinária da decisão condenatória. A aplicação dessas sanções não exclui a obrigação de reparação integral do dano causado.
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Processos administrativos: O processo administrativo para a apuração dos atos lesivos é detalhado nos artigos 8º a 16 da LAC, que estabelecem a necessidade de ampla defesa e celeridade na tramitação, observando os princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa. A instauração do processo administrativo é conduzida por uma comissão designada, composta por servidores estáveis, e deve comunicar ao Ministério Público sobre a instauração do processo.
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Acordo de Leniência: A LAC também prevê a possibilidade de celebração de acordos de leniência com pessoas jurídicas que colaborarem efetivamente com as investigações e processos administrativos, desde que resultem na identificação dos envolvidos e na obtenção de provas. Esses acordos podem isentar as pessoas jurídicas das sanções previstas ou atenuá-las, incluindo a possibilidade de redução da multa em até dois terços.
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Desconsideração da personalidade jurídica: A lei permite a desconsideração da personalidade jurídica sempre que esta for utilizada com abuso do direito para facilitar, encobrir ou dissimular a prática de atos ilícitos, ou para provocar confusão patrimonial, estendendo os efeitos das sanções aos administradores e sócios com poderes de administração.
Referências
MEIRELLES, Hely Lopes; BURLE FILHO, José Emmanuel; BURLE, Carla Rosado. Direito Administrativo Brasileiro. 42ª ed. São Paulo: Malheiros, 2016. p. 114-136.